A nutricionista Ana Paula Fioretti fala sobre “A Importância da Nutrição na Terceira Idade”
Em entrevista ao Melhor Viver, a nutricionista Ana Paula Fioretti* discutiu a temática sobre "A Importância da Nutrição na Terceira Idade”.
Segundo a nutricionista, a terceira idade é uma fase natural e inevitável da vida, pois “a partir do momento que a gente nasce a gente começa a envelhecer”.
A partir do momento que nascemos, nós começamos a envelhecer. Cada dia que vivemos, estamos chegando mais próximo da velhice e mais próximo do fim. Assim, o envelhecimento faz parte da nossa natureza e se trata de um processo natural da vida. No entanto, depende de como cada um vai querer envelhecer ou como cada um vai querer passar a vida e como estará quando chegar no que é considerado hoje como velhice ou terceira idade (após os 60 anos no Brasil). Tínhamos a expectativa de vida menor, onde as pessoas viviam até os 65 ou 70 anos de idade. Hoje não! Há idosos com 90 anos vivendo bem! Melhorou muito o acesso à saúde, à informação e a uma melhor qualidade de vida, o que levou a uma melhor expectativa de vida.**
No entanto, há fatores que levaram ao aumento na expectativa de vida nas últimas décadas como as recentes pesquisas que relacionam as doenças crônicas com um estilo de vida saudável e com hábitos alimentares correspondentes, além do maior acesso à saúde, às tecnologias desenvolvidas e à maior atenção dada pelos profissionais da saúde a esta faixa etária que tem aumentado em todo o mundo.
Antes não tínhamos tanto desenvolvimento na área da saúde e de tecnologias para esse público. Dependia-se muito de onde a família ou o indivíduo morava, se era zona urbana ou zona rural, e se poderia ter este acesso à saúde. Dependia também do tipo de trabalho exercido e se a pessoa conhecia ou não os tipos de doenças mais prevalentes e quais eram os métodos de prevenção mais adequados.
Hoje, tudo teve um avanço. Consegue-se determinar quais são os fatores de risco e orientar adequadamente a população, sendo que a mesma já tem mais acesso à consulta com os profissionais da saúde.
A própria transição demográfica como a mudança no perfil populacional, onde se tem muito mais idosos do que crianças, fez com que todos os países se organizassem para uma melhor atenção da população idosa. Devido a isso, no Brasil, surgiu a Política Nacional de Saúde do Idoso, que é uma atenção específica para essa população, com atividades voltadas para que os profissionais da saúde atendam esse público.
Acredito que todos estes fatores e condições fizeram com que aumentasse a expectativa de vida.
Desta forma, os profissionais, na atualidade, têm acesso facilitado a muitos estudos e literaturas científicas que lhes dão base para a orientação da população em geral e de forma especial, às pessoas que já se encontram na Terceira Idade. Assim, os idosos portadores de doenças crônicas, como artrite reumatoide, osteoporose, Alzheimer, problemas cardiovasculares como a arteriosclerose e hipertensão, câncer, dentre outras, podem ser beneficiados com a prevenção, remissão ou controle das mesmas por meio de mudanças no estilo de vida em geral e dos hábitos alimentares.
Penso que podemos falar da alimentação como prevenção, pois bons alimentos podem auxiliar na prevenção e no tratamento de diversas doenças crônicas e autoimunes. A alimentação é tudo na vida da pessoa e se ela conseguir regrar e equilibrar a alimentação, ela consegue resolver todos esses problemas.
Assim, quando o foco está em uma alimentação rica em frutas, verduras e legumes, gorduras de boa qualidade, cereais integrais, dentre outros alimentos naturais, e não mais nos industrializados ricos em gordura, corantes, aditivos e excesso de açúcar, é possível a prevenção de todas estas patologias. Por exemplo, alguns tipos de câncer estão relacionados à má alimentação. E o que seria esta má alimentação que provoca o câncer? Excesso de gordura, gordura de má qualidade, excesso de bebida alcoólica, excesso de café, dentre outros. E o que previne? Consumir alimentos funcionais que são aqueles que além dos seus nutrientes básicos, também possuem compostos bioativos que ajudam a não proliferar doenças.
Um fator importante que destacou, é sobre a adequação da alimentação à realidade de cada povo e cultura e a valorização que deve ser dada aos alimentos disponíveis na região. O fato, por exemplo, da Dieta Mediterrânea ser rica em frutos e grãos, não quer dizer que outras culturas devam comer frutos e grãos idênticos; mas, adequar os princípios encontrados de uma dieta saudável à realidade local.
Quando analisamos os estudos de populações, como a população mediterrânea que tem uma alimentação principalmente à base de frutos e cereais, você vê uma melhor qualidade do sangue e menos risco para doenças como a arteriosclerose, dentre outras. No entanto, o grande problema está em querer tornar essa dieta, a dieta padrão do mundo. Imagina o Brasil, um país continental, com cinco regiões completamente diferentes, em hábitos e cultura alimentar? Não tem como estabelecer uma única alimentação. Ao contrário, o Brasil tem muita diversidade como, por exemplo, a região do Amazonas que tem muitos frutos característicos da região e os habitantes do norte do país tem o privilégio de ter isso com muito mais facilidade. O INPA já analisou diversos alimentos desta região como tendo muitos recursos antioxidantes e funcionais. Sendo assim, para que utilizar uma Dieta do Mediterrâneo se o Brasil possui alimentos locais que podem oferecer as mesmas vantagens?
Um novo paradigma está sendo estabelecido, onde se passa a olhar para os fatores que promovem a saúde (salutogênese) e não para os fatores que desencadeiam a doença (patogênese).
Começou a se conhecer melhor sobre as patologias (sobre as doenças) ou também conhecido pelo termo 'patogênese' (origem da doença). Posteriormente, o sociólogo Aaron Antonovsky e vários de seus seguidores colocam que deveríamos começar a estudar a doença pela saúde propondo para isso o termo 'salutogênese' (origem da saúde). A partir deste termo, a busca passa a ser de 'como as pessoas têm saúde' e não de 'como as pessoas ficam doentes'. 'Apesar de existir vários riscos para a saúde, como eu ainda tenho saúde?' É uma mudança na visão da saúde e da doença. Começamos a enxergar pelo outro lado. Se falamos tanto de promoção de saúde e é o que temos que fazer hoje, por que o meu foco é sempre a doença e de como evitar a doença? Salutogênese é você mudar o olhar de como a pessoa adquiri a doença e pensar e verificar como surge a saúde, qual é a origem da saúde das pessoas.
Outra realidade no Brasil é a invasão dos Fast Food. Em oposição a este tipo de alimentação rica em componentes industrializados, sódio, calorias vazias, além de ser entendida como uma comida rápida que marca a vida contemporânea, surgiu o movimento Slow Food que vai contra todas estas premissas. Dentro desta nova realidade, o governo, por meio do Ministério da Saúde, também desenvolveu novas orientações resumidas dentro do Novo Guia Alimentar produzido em 2014.
Movimento Slow Food. Surge no final da década de 80, contrário ao movimento Fast Food e consequentemente contra tudo o que eles preconizam como o excesso de gordura, excesso de açúcar e da alimentação rápida. Não precisamos de nada disso! Então vamos resgatar os alimentos nativos, resgatar o nosso paladar, pois, comumente, quando vamos comer uma comida, achamos que está sem sal, sem gosto. Temos que colocar o nosso paladar a funcionar com os alimentos nativos.
Inclusive, têm projetos que estão replantando alguns alimentos que estavam em extinção. É o que a Política Nacional de Alimentação e Nutrição também tem procurado fazer. Temos que resgatar a cultura alimentar. O que é resgatar isso? Plantar e consumir o que a nossa terra produz! Resgatar aquilo que sempre consumimos aqui no Brasil e que as famílias passavam de geração em geração. Hoje, tem muitos profissionais que falam isso também – comer aquilo que você produziu, não comprando nada que venha embrulhado. Se você for comer o que está embrulhado é porque ele é industrializado. O ideal é que seja o mais natural possível.
Se achou que a evolução humana era relacionada com a maior industrialização; no entanto, se percebeu o mal que fez aos próprios humanos.
A primeira edição do 'Guia Alimentar' para a população brasileira foi em 2006 e a segunda, em 2014, já ganhou um novo formato, justamente falando sobre quanto mais processado for o alimento pior para o consumo. A orientação é procurar resgatar o natural. Para isso, o guia faz várias analogias para a pessoa entender o que é este alimento processado, minimamente processado e o que é o natural. A partir destas orientações, as pessoas poderão fazer escolhas mais inteligentes e melhores para a saúde. O Guia Alimentar é uma ferramenta de educação para a população, sendo acessível a todos, numa linguagem fácil de como prevenir as doenças e de melhorar a saúde por meio da alimentação.
É evidente a importância de se confiar na capacidade e vontade do paciente em fazer mudanças em seu estilo de vida e nos seus hábitos alimentares para que se tenha uma melhor qualidade de vida. Como Hipócrates dizia: “Que o teu alimento seja o teu remédio e que o teu remédio seja o teu alimento”.
Acredito que o profissional de saúde sempre deva confiar na capacidade do paciente. Se o profissional está oferecendo todas as orientações e se o paciente tiver vontade e for praticar as mudanças necessárias, o profissional tem que confiar plenamente. O paciente tem esta capacidade.
Aquilo que comemos reflete nas doenças que teremos ou reflete em nossa qualidade de vida. Pode não ter nenhuma doença diagnosticada; mas, surge a diminuição do bem-estar, já não dorme bem e outros sintomas que caracterizam uma má qualidade de vida sendo instalada na vida desta pessoa.
O alimento é sim o remédio. Conseguimos melhorar muitas patologias pelo alimento.
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* Ana Paula Fioretti – possui graduação em Nutrição pela Universidade Metodista de Piracicaba (2004) e mestrado em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Campinas (2010). Atualmente, é professora do curso técnico em Nutrição e Dietética do Centro Paula Souza, na Etec Hortolândia. É, também, professora convidada dos cursos de Pós-Graduação em Nutrição Pediátrica, Escolar e na Adolescência; de Nutrição Clínica: Metabolismo, Prática e Terapia Nutricional e de Prescrição de Fitoterápicos e Suplementação Nutricional Clínica e Esportiva da Universidade Estácio. Tem experiência na área de Nutrição, com ênfase em Nutrição, atuando principalmente nos seguintes temas: saúde coletiva, segurança alimentar e nutricional, educação nutricional.
** O método de transcrição utilizado (áudio da entrevista para a forma de texto) foi de "transcrição corrigida", onde eventuais erros cometidos, pausas e outras coisas incomuns à linguagem escrita não foram utilizados no texto. Desta forma, a leitura torna-se mais fluente. A entrevistada, Ana Paula Fioretti fez a revisão de sua fala transcrita.